Ativistas ambientais pedem uma moratória internacional sobre a mineração em alto mar.
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A cientista marinha brasileira Letícia Carvalho será a primeira mulher, oceanógrafa e pessoa de origem latino-americana a liderar a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos – e ela diz que isso “é fantástico”.
“Estou muito orgulhoso”, disse Carvalho à CNBC por videoconferência. “Acho que é bastante significativo que alguém novo, fresco e com uma perspectiva diferente venha assumir.”
A ISA, um regulador pouco conhecido da ONU que supervisiona a mineração em alto mar, é responsável tanto pela exploração como pela conservação de uma área que abrange cerca de 54% dos oceanos do mundo.
Carvalho recentemente derrotou o atual Michael Lodge ao cargo mais alto em um fortemente contestado eleição considerada um momento crucial para o destino de um país potencialmente multimilionário indústria. Seu mandato de quatro anos como chefe do ISA começará em 1º de janeiro de 2025.
Minerais essenciais como cobalto, níquel, cobre e manganês podem ser encontrados em nódulos do tamanho de batatas no fundo do mar.
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A vitória eleitoral de Carvalho surge num momento de intenso debate sobre o futuro da mineração em alto mar e dos oceanos do mundo.
A controversa prática de mineração em águas profundas envolve a utilização de maquinaria pesada para remover minerais e metais – como cobalto, níquel, cobre e manganês – do fundo do mar, onde se acumulam como nódulos do tamanho de batatas.
O uso final desses minerais é amplo e inclui baterias de veículos elétricos, turbinas eólicas e painéis solares.
Os cientistas alertaram que é difícil prever todos os impactos ambientais da mineração em alto mar. Entretanto, grupos de campanha ambiental dizem que a prática não pode ser realizada de forma sustentável e conduzirá inevitavelmente à destruição de ecossistemas e à extinção de espécies.
Eu ficaria muito preocupado se tivesse um pedido de exploração mineira na minha mesa sem um código mineiro.
Letícia Carvalho
Cientista marinho brasileiro
O Conselho da ISA, um órgão composto por 36 estados membros, recentemente encerrou uma série de reuniões na Jamaica enquanto procurava elaborar um código de mineração para regular a exploração e extração de nódulos polimetálicos e outros depósitos no fundo do oceano – antes do início da atividade de mineração.
Os negociadores estão a tentar garantir que as regras formais estejam em vigor até ao final de 2025 e Carvalho diz que continua a ser viável que os Estados-membros consigam atingir este objetivo.
“Minha obrigação como secretário-geral é preparar o terreno para que eles possam finalizar o trabalho até o final do próximo ano. E farei tudo ao meu alcance para fazê-lo”, disse Carvalho.
‘Cacofonia e caos’
A luta para chegar a um consenso sobre um código de mineração foi motivada por Nauru em 2021, quando o estado insular do Pacífico informou a ISA da sua intenção de iniciar a mineração em alto mar.
Isso desencadeou uma disposição controversa na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, conhecida como a “regra dos dois anos”, que permite a apresentação de pedidos de mineração, quer o código de mineração tenha sido finalizado ou não.
Isso levou algumas empresas a buscar cronogramas agressivos para extração, com a The Metals Company (TMC) do Canadá em 2023 dizendo que pretende buscar uma licença para extrair minerais do fundo do mar até o final deste ano.
Gerard Barron, presidente e CEO da The Metals Company, espera que sua empresa seja capaz de explorar níquel, cobalto e manganês no fundo do mar no Oceano Pacífico.
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Questionado sobre os planos da TMC, Carvalho respondeu: “É justo. Faz parte da lei, eles têm o direito de apresentar o seu pedido”.
Ela alertou, no entanto, sobre os riscos de litígio em tal cenário. “Eu ficaria muito preocupado se tivesse um pedido de exploração mineira na minha mesa sem um código mineiro”, disse Carvalho.
“Na minha experiência, a estabilidade regulatória para as empresas e a sociedade é realmente fundamental. Se não há estabilidade, então há uma cacofonia e um caos porque abre espaço para litígios em diferentes níveis”, acrescentou.
“E particularmente a mineração em águas profundas como atividade tem muitos intervenientes, o que significa que muitos tribunais seriam chamados a dar a sua opinião, não apenas a nível internacional, mas também a nível nacional”.
Um estudo ‘alucinante’ sobre oxigênio escuro
Carvalho, que anteriormente atuou como chefe do departamento marinho e de água doce da ONU, disse que sua principal prioridade como chefe da ISA seria a gestão do próprio regulador.
“Para mim ficou bastante claro que a questão principal é a governação da própria ISA. Há uma necessidade para mim, claramente, de reconstruir a confiança”, disse Carvalho.
“Não quero criticar ninguém ou qualquer indivíduo especificamente, mas penso que a realidade dos factos é que há muita transparência e responsabilização a serem implementadas”.
Uma equipa de cientistas internacionais descobriu que o oxigénio está a ser produzido na escuridão total, aproximadamente 4.000 metros abaixo da superfície do oceano.
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Cinco anúncios recentes em apoio a uma pausa preventiva ou moratória para a indústria nascente significam que mais de 30 países apelaram agora à suspensão do início da mineração em alto mar.
O impulso crescente para uma pausa surge pouco depois de um estudo inovador ter descoberto que o chamado “oxigénio escuro” está a ser produzido por nódulos polimetálicos a milhares de metros abaixo da superfície do Oceano Pacífico.
As descobertas, publicadas no Geociências da Natureza jornal no mês passado, provavelmente levantarão novas preocupações sobre os riscos da mineração em alto mar.
Carvalho descreveu as conclusões do estudo como “alucinantes”, acrescentando que as preocupações ambientais deveriam estar na vanguarda da agenda da ISA.
Quando questionado sobre as demandas de grupos ambientalistas para proteger as profundezas do oceano contra máquinas pesadas de mineração, Carvalho respondeu: “Eu diria que essa proteção tem que ser entregue no código de mineração através da ISA. Não vejo nenhum outro instrumento no mundo que poderia entregar isso.”
Carvalho disse não ter medo do debate sobre o futuro da mineração em alto mar.
“Eu sou o oposto, eu aceito completamente porque é isso que a ISA tem que fazer. A liderança da ISA tem que ler completamente o que está escrito na lei, que é entregar um código de mineração que possa honrar a disposição da lei que diz que o oceano não deveria ser prejudicado”, disse Carvalho.
“Qual é a definição de dano? É isso que temos que discutir”, acrescentou ela.