POR VITOR PRADO DOS ANJOS
Muitas vezes, os pescadores e as pescadoras são os primeiros a testemunhar e sentir as consequências das perturbações ambientais no mar. Porém, não é incomum que enfrentem inúmeras dificuldades no registro de reclamações, devido à burocracia do procedimento e à dificuldade em indicar o local exato do incidente.
No final de julho, lideranças da pesca artesanal, ambientalistas e representantes de órgãos ambientais federais e da Marinha do Brasil se reuniram na Ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro, para lançar um aplicativo criado por pescadores artesanais, em parceria com a ONG 350.org Brasil, que tem como objetivo facilitar denúncias de irregularidades ambientais causadas pelo setor de petróleo e gás na Baía de Guanabara.
Como funciona o aplicativo dos pescadores
A aplicação De olho na Guanabara
permite ao usuário fazer denúncias georreferenciadas, acompanhadas de foto ou vídeo, de forma rápida, simples e anônima. Uma vez registradas, as denúncias serão investigadas pelos moderadores e, caso validadas, encaminhadas às autoridades competentes (Ibama, ICMBio e Marinha do Brasil). Os relatórios validados são exibidos em um mapa público que pode ser acessado pelo site do aplicativo.
No momento, o acesso ao aplicativo está restrito apenas aos pescadores com cadastro homologado pela Associação de Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara (Ahomar).
Alexandre Anderson, pescador, diretor da Ahomar e um dos criadores do aplicativo, conta à Mongabay que a iniciativa surgiu da vontade de “não depender apenas do poder público, que muitas vezes não tem a mesma velocidade de uma mancha de óleo”.
Em 2013, os pescadores passaram a monitorar a baía de forma independente, compartilhando informações em um grupo de WhatsApp. “Utilizamos nosso barquinho, fomos até o local, fotografamos a mancha de óleo, um descarte irregular ou um grande vazamento, marcamos o ponto com as coordenadas e usamos o próprio WhatsApp para denunciar”, lembra Alexandre.
Após firmar parceria com a 350.org, ONG internacional que luta por uma transição energética justa, Alexandre explica que a proposta era criar uma tecnologia que fosse “acessível a todos os pescadores, pescadoras, jovens, idosos e pessoas da comunidade que têm a tendência de proteger seu ecossistema, seu meio ambiente.”
Assistência na prevenção
Alexandre espera que a aplicação tenha efeito preventivo. “Quando houver pescadores, barcos e embarcações por perto, as pessoas vão pensar que têm o aplicativo, então voltarão ao seu ato criminoso de poluir.”
Aline Luz, pescadora da Ilha de Itaoca e membro da Associação de Pescadores e Capitães do Siri da Praia da Luz, compartilha com a Mongabay sua relação com o maremoto (junção da maré com o território) da baía do Rio de Janeiro. “Sou a oitava geração da minha família na pesca e, como pescadores, tentamos proteger o lado em que trabalhamos. Sem a Baía de Guanabara não podemos viver e sou muito grato a ela por todos esses anos de trabalho.”
Apesar disso, Aline relata que fazer uma reclamação “é uma burocracia tão grande que no final você acaba desistindo”. Aline acredita que o aplicativo facilitará esse processo. “Acho que vai melhorar muito. Para nós, isso é uma ferramenta, uma arma para combater essa poluição que está em toda a Baía de Guanabara.”
Após conhecer o aplicativo, Alessandra Baptista, pescadora e diretora social da Associação de Pescadores e Pescadoras da Vila Pinheiro e Maré (Apemar), disse que “é de fácil acesso, é simples, é humano”.
Para ela, a iniciativa simboliza um passo importante rumo a uma Baía de Guanabara descontaminada. “É isso que queremos: peixe de qualidade, qualidade na nossa água, qualidade de vida. Vamos dar dores de cabeça às empresas que infelizmente estão prejudicando o nosso meio ambiente.”
Este texto foi republicado em Mongabay
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A postagem Pescadores artesanais criam aplicativo para denunciar crimes ambientais
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