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Não é hora de parar de culpar o “dedo podre” por todas as más escolhas relacionamentos e decepções românticas? Escolher sempre o tipo de pessoa que te traz sofrimento não é questão de azar. Por trás disso pode estar o que os psicólogos que seguem a Terapia do Esquema chamam de ‘ química esquemática”.
Como explica a psicóloga e psicoterapeuta Helena Emerich do Esquema, a química esquemática é o nosso nível de atração, muitas vezes inconsciente, pelas pessoas e que está ligado à busca pelo que é familiar – mesmo que seja ruim. “A partir desse conceito podemos entender porque nos sentimos atraídos por quem nos atrai”, afirma o especialista em entrevista ao CAPRICHO.
Imagine uma situação hipotética em que você tem que fazer uma escolha de ter um relacionamento entre a pessoa 1, que é super meiga, atenciosa e disponível para você, e a pessoa 2, que não se importa com você, e quanto mais elas desaparecem, mais parece que seu amor por ela floresce. Conscientemente, qual você escolheria?
Segundo Helena, se buscássemos o amor de forma mais consciente, escolheríamos sempre quem melhor atendesse às nossas necessidades (pessoa 1, no caso), mas nem sempre é isso que acontece. Muitas vezes ficamos presos em padrões emocionais que nos levam a repetidas situações de sofrimento.
A Teoria do Esquema
A Teoria dos Esquemas, desenvolvida por Jeffrey Young, propõe uma evolução aos conceitos já trabalhados pela Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). Essa abordagem busca compreender os padrões e o ambiente em que o indivíduo foi inserido para desenvolver determinado temperamento ou comportamento.
“Uma criança que foi exposta a muita negligência e muita violência, por exemplo, pode desenvolver padrões emocionais de desconfiança ao longo da vida. Afinal, quem mais deveria cuidar dela não fez isso, então é compreensível que ela se sinta insegura com todos que tentam se aproximar dela”, explica a psicóloga.
Essa dinâmica, desenvolvida na infância e na adolescência, a acompanha até a idade adulta e afeta muito seus relacionamentos. Muitas vezes, por mais que tenha sofrido com essa situação, ela busca experiências semelhantes, apenas porque são familiares e ela já as conhece. Isso impacta até mesmo quem atraímos e com quem escolhemos ter um relacionamento romântico – e é aí que entra a discussão da química esquemática.
As armadilhas da química (esquemático)
Bruno Cardoso, psicólogo, terapeuta relacional e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que existe uma química mais neurobiológica, que existirá no processo de atração fisiológica – encontrar alguém muito bonito e fisicamente atraente – e uma química isso é mais esquemático. Este segundo, segundo ele, é mais cognitivo e está mais relacionado a pensamentos e emoções. “É muito complicado, porque traz algo muito familiar, mas que leva ao sofrimento”, afirma.
A psicóloga explica que a química esquemática tem duas dimensões: uma é a atração e a outra é a ilusão. A atração, como já dissemos aqui, pela busca pelo conhecido, enquanto a ilusão é a expectativa idealizada sobre o outro. “Ela olha para outra pessoa não pelo que ela realmente é, mas pelo que ela espera que ela seja”, explica ele. Por isso é tão comum que pessoas que possuem essa química esquemática não percebam sinais de comportamento tóxico e abusivo, já que não estão realmente vendo a realidade, mas sim presas em padrões emocionais presentes em suas histórias de vida.
Bruno escreveu um livro sobre o assunto intitulado ‘Armadilhas da Química do Amor’ . Nele, ele e a psicóloga Kelly Paim destacam oito armadilhas muito comuns que perceberam em suas práticas e nas quais as pessoas insistem em cair em seus relacionamentos. Além de explicar melhor cada um desses sinais, o livro também traz exercícios para refletir sobre esses comportamentos. Em entrevista ao CAPRICHO, ele listou, de forma mais resumida, esses padrões que as pessoas precisam estar atentas:
- Você se sente atraído por pessoas que não prestam atenção em você e não te validam;
- Você se sente atraído por pessoas que te diminuem e não te dão espaço para expressar seus sentimentos;
- Você se sente atraído por pessoas instáveis e que não lhe dão a segurança que você precisa;
- Você se sente atraído por pessoas que exigem muito de você e que você não consegue se expressar livremente;
- Você se engana com o comportamento da pessoa e acredita que tem que manter esse relacionamento, mesmo que isso lhe traga um sofrimento intenso;
- Você acredita que é o problema no relacionamento e que precisa se sacrificar para manter esse relacionamento;
- Você se concentra exclusivamente nas características físicas ou no desempenho sexual e deixa de lado suas necessidades emocionais;
- Você se sente atraído por pessoas de quem gosta.
Como consertar dedo podre?
Ao analisar esse ‘dedo podre’ sob a perspectiva da Teoria dos Esquemas e da química esquemática, é possível pensar em maneiras de resolver esse problema.
Antes disso, vale entender que a Teoria do Esquema defende que todas as pessoas necessitam que suas necessidades emocionais básicas sejam atendidas por meio de vínculos saudáveis. Eles são:
- Laços seguros com outros indivíduos – o que inclui segurança, estabilidade, cuidado e aceitação;
- Autonomia, competência e sentido de identidade;
- Liberdade de expressão, necessidades e emoções válidas;
- Espontaneidade e lazer;
- Limites realistas e autocontrole.
Cada pessoa tem uma demanda diferente em relação a essas necessidades emocionais, com intensidades, frequências e afetos diferentes, variando de acordo com seu temperamento e ambiente familiar. Diante dessa lista, Bruno orienta que as pessoas parem para pensar e identificar suas necessidades emocionais e depois avaliem se as pessoas com quem escolhem interagir estão caminhando ou não em direção a essas necessidades. A terapia é essencial nesse processo, sabia? Assim será possível entender o que é preciso fazer para quebrar padrões, mudar a história e construir relacionamentos mais saudáveis.
Isso não significa, porém, que você precise se relacionar apenas com pessoas por quem não se sente atraído. “Não se trata de você se esforçar muito para gostar de alguém, trata-se de você entender o que você precisa e até entender o seu desconforto ao pensar na possibilidade de escolher quem gosta de você e te garante um relacionamento mais fácil”, explica a psicóloga, que destaca a importância de pensando mais sobre isso e se permitindo seguir novos rumos.
Helena acrescenta que é preciso separar a paixão, que é algo mais intenso e superficial, do amor mais profundo e constante. Relacionamentos bem-sucedidos de longo prazo são aqueles em que ambas as partes atendem às necessidades emocionais uma da outra. Com essa maturidade fica mais fácil entender que será inevitável sentir química por alguém, mas nem sempre é saudável e é a melhor escolha.