O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, determinou a suspensão da execução de todas as emendas obrigatórias apresentadas por deputados e senadores até que o Congresso estabeleça regras de transparência na aplicação dos recursos.
A determinação, assinada nesta quarta-feira, 14, não se aplica a valores destinados a obras em andamento ou ações de resposta a calamidades públicas. O despacho do magistrado, no âmbito de ação movida pelo PSOL, deverá ser analisado no plenário virtual da Corte nos próximos dias.
Na prática, as alterações obrigatórias são aquelas que o governo federal é obrigado a custear. Para este ano, a previsão é que o Executivo tenha que enviar aos redutos eleitorais dos congressistas pelo menos 33 bilhões de reais nesta forma de pagamento – o valor é mais que o triplo do registado há quase uma década.
Para o juiz, a execução de emendas que não tenham critérios de eficiência, transparência e rastreabilidade é incompatível com a Constituição. O procedimento estabelecido com as emendas, segundo Dino, tira grande parte da liberdade de decisão do Executivo sobre a implementação de políticas públicas e transforma membros do Legislativo em “coordenadores de despesas”.
“É uma anomalia grave termos um sistema presidencialista, decorrente do voto popular, coexistindo com a figura do parlamentares que ordenam despesas discricionárias como se as autoridades administrativas fossem“, escreveu. O ministro destacou ainda que o “desenho prático equivocado” das alterações tributárias gerou a “parlamentarização dos gastos públicos”.
Na semana passada, o PSOL pediu ao Supremo a suspensão de trechos de projetos que obrigam o Poder Executivo a custear emendas apresentadas por parlamentares e bancadas estaduais.
Esta forma de controlar parte do Orçamento, segundo o partido, viola a separação de Poderes e “determina uma profunda desordem no modelo de determinação orçamental” previsto na Constituição, uma vez que confere ao Legislativo o primado sobre a gestão e o poder de despesas do pedido.
“A captura orçamentária atingiu níveis recordes e, para 2024, a previsão é que o volume de emendas corresponda a 20,03% do total das discricionárias e com isso todos os seus efeitos nefastos: dificulta o ajuste fiscal, o planejamento e a execução. das políticas públicas, do equilíbrio das contas públicas e, até, do desempenho da economia no longo prazo”, sustentou a sigla.
Os dispositivos questionados pelo PSOL estão em propostas aprovadas no Congresso em 2015. As matérias obrigam o Executivo a custear parte das emendas apresentadas pelos parlamentares, até o limite de 2% do valor. Receita Corrente Líquida (indivíduos) e 1% (bancada).
Com a decisão desta quarta, Dino aumenta a ofensiva contra o poder do Legislativo sobre pedaços do Orçamento pela falta de transparência e controle na aplicação dos recursos públicos. Por outro lado, abre caminho para um mal-estar político entre os parlamentares, que ficaram irritados com as recentes ordens do magistrado.
Na semana passada, o ministro suspendeu o pagamento das emendas Pix, modalidade aprovada pelo Congresso em 2019 em que dinheiro público é enviado pelos parlamentares para seus redutos eleitorais sem precisar passar pelos ministérios.
O juiz abriu exceção apenas para transferências que atendam aos requisitos de transparência e rastreabilidade de valores. Há permissão também no caso de repasses para obras em andamento e atendimento a situações de calamidade pública, desde que adotado sistema de transparência.
Antes, proibia o Executivo de executar emendas de comissões (indicadas pelos presidentes dos órgãos temáticos do Congresso) que não seguissem regras de transparência e rastreabilidade, além de estabelecer critérios para seu pagamento. O ministro do STF também pediu à Controladoria-Geral da União que passe um pente fino nos repasses realizados nos últimos anos.
O entendimento de Dino é que a falta de controle na aplicação desses recursos repete o problema das emendas do relator, que ficaram conhecidas como Orçamento Secreto e foram utilizadas pelo governo Jair Bolsonaro (PL) para melhorar seu relacionamento com a liderança no Congresso.