O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sugeriu procurar o secretário especial da Receita Federal, José Tostese o então chefe do Serpro, empresa de tecnologia e processamento de dados do governo federal, para tratar das investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro no caso das ‘rachadinhas’.
A sugestão aparece em áudio gravado durante reunião com o deputado federal Alexandre Ramagem, à época chefe da Agência Brasileira de Inteligência, o general Augusto Heleno (ministro do Gabinete de Segurança Institucional) e dois advogados do parlamentar.
Na gravação, Bolsonaro se refere ao engenheiro Gustavo Canuto como sendo o chefe do Serpro. Na época, porém, ele já estava à frente da Dataprev, outro órgão que processa dados de programas sociais do governo federal.
O encontro aconteceu em agosto de 2020, no Palácio do Planalto. A gravação, cujo sigilo foi desclassificado nesta segunda-feira, estava no celular de Ramagem e foi apreendida pela Polícia Federal nas investigações sobre o uso da Abin para espionar adversários políticos de Bolsonaro.
“É o caso de falar com o chefe da Receita Federal”, disse o então presidente. Questionado por interlocutores sobre a possibilidade de vazamento da iniciativa, ele acrescenta: “Não tem problema nenhum. Não tem problema em falar com ele (José Tostes). Não haverá problema em falar com Canuto.”
O objetivo da consulta aos chefes da Receita e do Serpro foi identificar os funcionários que haviam feito um pente fino nas contas de Flávio e, com isso, subsidiar as investigações sobre um suposto esquema de devolução de parte dos salários dos funcionários do Assembleia Legislativa do Rio. de janeiro.
“Olha, em teoria, com um clique você pode descobrir se um funcionário da Receita Federal [inaudível] esses acessos aí”, explicou a advogada Luciana Pires. “Tente avisá-lo que ele tem que manter esse trecho bem fechado. Tirando de pessoas em quem ele confia”, completou o general Heleno.
Durante o diálogo, Bolsonaro questiona os advogados sobre qual seria a melhor forma de “resolver esse assunto”. A advogada Juliana Bierrenbach, outra defensora de Flávio, diz acreditar que o melhor caminho é o Serpro. Bolsonaro responde: “Vou falar com Canuto”.
Leia a transcrição da conversa:
- JAIR BOLSONARO: É o caso de conversar com o chefe da Receita Federal. O que ele está pedindo é um favor.
- LUCIANA PIRES (advogada): Não, não, presidente.
- JAIR BOLSONARO: Ninguém está pedindo favor aqui. [inaudível] É uma boa ideia conversar com o chefe do IRS. Tostes.
- LUCIANA PIRES: E não, não tem chance dele não sair dessa, né? [inaudível]?
- JULIANA BIERRENBACH (advogada): Não.
- JULIANA BIERRENBACH: Não, Tostes não.
- ALEXANDRE RAMAGEM: [inaudível] Ele é o secretário da receita. É zero dois, não é?
- AUGUSTO HELENO Não. Zero um.
- JAIR BOLSONARO: Ele é um dos caras. Ele era meu ministro e foi para lá. Sem problemas. Não há problema em falar com ele. Não haverá problema em conversar com Canuto.
- LUCIANA PIRES: Serpro?
- LUCIANA PIRES: Que ótimo.
- JAIR BOLSONARO: Devo falar com Canuto?
- LUCIANA PIRES: Sim, sim.
- LUCIANA PIRES: Com um clique.
- LUCIANA PIRES: Olha, em teoria, com um clique você descobre se um funcionário da Receita [inaudível] esses acessos aí.
- AUGUSTO HELENO: Tente avisar ele que ele tem que manter esse setor bem fechado. Aprenda com pessoas em quem ele confia. Se vazar [inaudível].
- JAIR BOLSONARO: Isso mesmo. E, para ser bem claro, nunca sabemos se alguém está gravando alguma coisa. Que não buscamos o favor de ninguém.