O presidente Lula (PT) discursou nesta terça-feira, 24, no evento “Em defesa da democracia: lutando contra o extremismo”, que acontece à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas. O encontro acontece em Nova York, nos Estados Unidos.
Em seu discurso, Lula relembrou os atos golpistas do dia 8 de janeiro e o ataque ao Capitólio, nos EUA. “É inegável que a democracia vive atualmente o seu momento mais crítico desde a Segunda Guerra Mundial. No Brasil e nos Estados Unidos, as forças totalitárias promoveram ações violentas para contestar os resultados das urnas”, disse ela.
“Nossa luta é para que a democracia seja novamente percebida como o caminho mais eficaz para alcançar e concretizar direitos. Para devolver a esperança a milhões de pessoas deserdadas pela globalização, precisamos de colocar a economia ao serviço do povo”, afirmou o presidente.
Lula reforçou ainda que os líderes mundiais devem ouvir os movimentos sociais, os estudantes, as mulheres, os trabalhadores, os empresários, as minorias raciais, étnicas e religiosas. “A experiência brasileira mostra que o equilíbrio entre os poderes constituídos e a resiliência e o fortalecimento das instituições são cruciais na proteção desses princípios”, afirmou.
Ao abrir a 79ª Assembleia Geral da ONU, nesta terça-feira, Lula criticou a falta de atualização na forma de funcionamento da organização, que segue a mesma carta de princípios de 80 anos atrás.
Citou os conflitos que ocorrem na Ucrânia e no Médio Oriente, além das guerras no Sudão e no Iémen. Além disso, criticou a falta de regulamentação das plataformas digitais que permite a propagação de desinformação e intolerância.
Confira a íntegra do discurso:
Quero agradecer a todos aqueles que responderam ao convite que o presidente Pedro Sánchez e eu fizemos para esta reunião.
Não pretendo apresentar aqui um diagnóstico abrangente das ameaças que enfrentamos.
Mas é inegável que a democracia atravessa actualmente o seu momento mais crítico desde a Segunda Guerra Mundial.
No Brasil e nos Estados Unidos, as forças totalitárias promoveram ações violentas para contestar os resultados das urnas.
Na América Latina, as notícias falsas corroem a confiança e afetam os processos eleitorais.
Na Europa, uma mistura explosiva de racismo, xenofobia e campanhas de desinformação coloca em risco a diversidade e o pluralismo.
Em África, os golpes de Estado demonstram que o uso da força para derrubar governos ainda reflecte os vestígios do colonialismo.
Compreender por que razão a democracia se tornou um alvo fácil para a extrema direita e para as suas falsas narrativas é um desafio partilhado.
O extremismo é um sintoma de uma crise mais profunda, com múltiplas causas.
A democracia liberal revelou-se insuficiente e frustrou as expectativas de milhões de pessoas.
Tornou-se apenas um ritual que repetimos a cada 4 ou 5 anos.
Um modelo que funciona para o grande capital e deixa os trabalhadores entregues à sua própria sorte não é democrático.
Um sistema que privilegia os homens brancos e falha com as mulheres negras é imoral.
A abundância para alguns e a fome para muitos no século XXI é o prelúdio do totalitarismo.
A nossa luta é para que a democracia seja novamente vista como o caminho mais eficaz para alcançar e concretizar direitos.
Para restaurar a esperança a milhões de pessoas deserdadas pela globalização, precisamos de colocar a economia ao serviço do povo.
Isto não significa acabar com o mercado livre, mas sim recuperar o papel do Estado como planeador do desenvolvimento sustentável e como garante do bem-estar e da equidade.
A liberdade de expressão é um direito fundamental e um dos pilares centrais de uma democracia saudável, mas não é absoluta.
Encontra os seus limites na protecção dos direitos e liberdades dos outros e da própria ordem política.
As tecnologias digitais ajudam a promover e disseminar o conhecimento, mas também agravam os riscos para a coexistência civilizada entre as pessoas.
As redes digitais tornaram-se um terreno fértil para discursos de ódio misóginos, racistas e xenófobos que fazem vítimas todos os dias.
As nossas sociedades estarão sob constante ameaça até que sejamos firmes na regulação das plataformas e na utilização da inteligência artificial.
Nenhuma empresa ou indivíduo de tecnologia, por mais rico que seja, pode se considerar acima da lei.
Eles precisam ser responsabilizados pelo conteúdo que circulam.
Temos novos desafios diante de nós para os quais ainda não conseguimos encontrar respostas.
A extrema direita também se tornou eleitoralmente viável ao organizar o descontentamento em torno de um discurso identitário inverso. Culpam os migrantes, as mulheres e as minorias pelos problemas de hoje.
E fazem-no forçando os limites das instituições democráticas.
Ceder a essas narrativas é cair numa armadilha.
Recuar não irá apaziguar o espírito violento daqueles que atacam a democracia para silenciar e retirar direitos.
Não há contradição entre coesão social e respeito pela diversidade. O pluralismo torna-nos mais fortes.
A democracia na sua plenitude é a base para a promoção de sociedades pacíficas, justas e inclusivas, livres do medo e da violência.
É fundamental para um mundo de paz e prosperidade.
A história nos ensinou que a democracia não pode ser imposta.
A sua construção é única para cada povo e cada país.
Para resgatar a sua legitimidade, precisamos recuperar a sua essência, e não apenas a sua forma.
A participação social é uma das principais formas de fortalecer a identidade democrática.
A democracia não é um pacto de silêncio.
Precisamos ouvir os movimentos sociais, os estudantes, as mulheres, os trabalhadores, os empresários, as minorias raciais, étnicas e religiosas.
Proteger aqueles que defendem os direitos humanos, o ambiente e a democracia é também essencial.
A experiência brasileira mostra que o equilíbrio entre os poderes constituídos e a resiliência e o fortalecimento das instituições são cruciais na proteção desses princípios.
Só uma democracia revigorada nos permitirá resolver os dilemas das nossas sociedades e do mundo contemporâneo.
Muito obrigado.