O sucesso ou fracasso do governo Lula no enfrentamento dos problemas ambientais e da crise climática não pode ser medido pelo metro do que foi feito em relação à gestão criminosa e devastadora do governo de Jair Bolsonaro nessas áreas. O medidor precisa ser definido em relação às urgências e necessidades que essas questões exigem em termos de ações de uma administração consciente da gravidade desses problemas. E se o metrô deveria ser assim, não há nada de errado: o governo Lula não conseguiu enfrentar os desafios.
No governo Bolsonaro, a negação da crise climática era ideológica. No governo Lula o negacionismo é omisso. Ou seja, o governo não faz o que deveria ser feito de forma consciente. E aqui não se trata de colocar o peso do fracasso nas costas do Ministério do Meio Ambiente, do Ibama e de outros institutos ou do Ministério dos Povos Indígenas. Bolsonaro deixou o ministério, o Ibama e outras instituições em ruínas. Lula os mantém miseráveis, esgotados, sem recursos e sem meios e condições para agir. Esta é a natureza do negacionismo omisso que domina a liderança do atual governo.
O fracasso ocorre em diversas frentes. Mas a face mais visível, neste momento, são os incêndios que transformam as florestas em esqueletos carbonizados, pintando o céu azul de cinzento com fumo e fuligem. Fumaça que penetra nas profundezas dos pulmões e esconde a luz do sol em plena luz do dia. Todos sabemos que os incêndios resultam de ações humanas e são causados por indivíduos. É incrível que algumas pessoas em todo o Brasil tenham incendiado o país, causando prejuízos de bilhões de reais, espalhando doenças respiratórias e pulmonares em cidades inteiras e levando à morte de animais e seres humanos. Além de incrível, é inaceitável. Assim como é inaceitável qualquer justificativa escapista do governo, por não ter sido prudente, previdente, por não ter planejado. Ele só agiu quando o estrago estava feito e quando os remédios que aplicou pouco puderam fazer para conter a dolorosa destruição dos biomas.
A prova mais completa de que o governo omitiu e fracassou é a determinação do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, de mobilizar em 15 dias o maior contingente possível da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, da Força Nacional e das Forças Armadas. para combater incêndios, principalmente na Amazônia e no Pantanal. Em ações julgadas em março, o STF havia definido a necessidade de o governo federal proteger esses biomas contra incêndios, determinando a elaboração de um plano nacional no prazo de 90 dias. Pouco mais do que nada foi feito.
Governos e prefeitos são tão responsáveis quanto a União pela tragédia
Os maiores parceiros do governo federal no negacionismo omisso são governadores e prefeitos. A proibição do uso de qualquer tipo de fogo para limpar áreas rurais e queimar pastagens secas deveria ter sido adotada em maio, em todo o território nacional. Ou seja, o governo federal e os estados não se muniram de uma legislação eficaz e duradoura. Eles preferiam uma espécie de laissez-faire de omissão, acreditando nas provisões da natureza ou em algum deus.
Além de não se munirem de legislação, não aumentaram as capacidades de combate a incêndios materiais, como aeronaves de grande porte, barcos e outros equipamentos. A estrutura material de combate aos incêndios no país é precária. O mesmo ocorre com o número de brigadistas à disposição do Ibama e do ICMBio. Até o número de contratações temporárias é absurdamente insuficiente. Elogie esses brigadistas, mal treinados e mal equipados, que trabalham até a exaustão, colocando suas próprias vidas em risco, enquanto os ocupantes de escritórios acarpetados em Brasília se vangloriam de compromissos ambientais em retórica vazia.
O Ministério Público Federal vem cobrando ações do governo federal e ajuizando ações judiciais desde o início do ano, apontando indícios de omissão. O governo não conseguiu adotar outras iniciativas. Não realizou uma ampla campanha nacional de conscientização sobre os riscos de incêndios, algo que seria crucial para engajar a sociedade no enfrentamento do problema. Também não investiu em programas de educação ou coordenação com os agricultores, para que práticas perigosas fossem abandonadas em favor de uma gestão mais sustentável. Considerando que o problema das queimadas tem se agravado ano após ano, o governo deveria investir para que todos os biomas e unidades de conservação tenham planos logísticos antecipados de combate às queimadas, integrando a União, estados e municípios.
Várias outras medidas poderiam e deveriam ter sido adotadas. Tanto nos biomas e áreas de conservação quanto nas fazendas e áreas agrícolas, linhas ou corredores de incêndio poderiam ser abertos antecipadamente para evitar a continuidade e propagação das chamas de uma área para outra, de uma fazenda para outra ou dentro da mesma fazenda. É claro que os observadores da omissão argumentariam que é dispendioso. Mas custaria muito menos do que os milhares de milhões em perdas causadas pelos incêndios devastadores. Bilhões de perdas aumentaram anualmente, pois as medidas preventivas durariam mais tempo e reduziriam drasticamente o volume de perdas.
O governo Lula corre o risco de chegar à COP-30, que será realizada em Belém do Pará no próximo ano, mostrando uma falha monumental no seu dever de preservar os biomas da destruição pela ação humana e pelo fogo. Você pode chegar à COP com a cara cinzenta do negacionismo omisso. •
*Professor da Faculdade de Sociologia e Política e autor de Liderança e Poder.
Publicado na edição nº. 1326 de CartaCapitalem 4 de setembro de 2024.
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